por Dom Eduardo Benes de
Sales Rodrigues, Arcebispo de Sorocaba.
Artigo publicado na edição impressa do jornal Cruzeiro do Sul, de
Sorocaba,SP, e disponível em: http://www.cruzeirodosul.inf.br/acessarmateria.jsf?id=410253
No próximo dia 15,
aniversário de criação do povoado de Sorocaba em 15 de agosto de 1654,
celebramos a festa de Nossa Senhora da Ponte, cuja imagem, chegada ao Brasil em
1771, é um símbolo expressivo da presença da Mãe de Deus em nossa Igreja e na
alma de nosso povo.
Invocar Nossa Senhora
como “da Ponte”, qualquer que seja a origem dessa devoção, nos remete ao lugar
ocupado pela mãe de Jesus, na obra de nossa Redenção.
Não há como evitar
que nos venham à mente todos os momentos narrados no evangelho da participação
de Maria na missão salvífica de Jesus.Jesus é o Sumo Pontífice, ou seja, a grande Ponte entre o céu e a terra, vale
dizer entre o Pai e a humanidade. Mas para fazer a passagem, para ser o
Pontífice dos bens futuros, o Verbo deveu nos chegar pelo ventre de Maria de
quem o Pai, pelo ministério do arcanjo Gabriel, aguardou a resposta: “faça-se
em mim segundo a tua palavra”. E, então, “o Verbo se fez Carne e
habitou entre nós.”
Desde então a mãe
esteve unida ao Verbo feito carne no operar a salvação da humanidade. É
impossível também não recordar o episódio das bodas de Caná quando Maria,
sentindo a aflição da família que celebrava as bodas de seu filho, se dirigiu a
Jesus, dizendo: “eles não têm mais vinho”. Jesus pergunta “o que a mim e a ti,
mulher?”(em tradução literal). E logo depois afirma: “Ainda não chegou a minha
hora”. Mas Jesus faz o milagre e salva a festa.
O sentido,
entretanto, da pergunta de Jesus “o que isso tem a ver conosco” (tradução pelo
sentido) com a sequente afirmação “ainda não chegou a minha hora” revela que
entre a “Mulher”, Maria, e Ele existe uma relação muito profunda que vai se
revelar quando chegar a “Hora”. Quando chegou a “Hora” -- é o mesmo evangelista
João que narra -- lá estava a ”Mulher”, de pé ao pé da Cruz. Foi quando Jesus
lhe disse: “Mulher, eis aí o teu filho”, e, dirigindo-se logo ao discípulo,:
“Eis aí tua mãe”. Como não ver na expressão “Mulher” uma referência ao texto de
Gênesis 3,15: “porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e
a descendência dela”?
A Virgem Maria é a
primeira resgatada por Cristo, preservada do pecado para unir-se a Ele na nossa
salvação, participando do resgate de toda a humanidade, representada por João
ao pé da cruz, a ponto de ser proclamada, pelo próprio Cristo, mãe dos
resgatados, no instante mesmo em que o redentor consumava sua existência
salvífica.
Os padres da Igreja -
primeiros escritores cristãos - chamaram Maria de “a Nova Eva” e São Bernardo,
com muita acuidade, ao comentar a lancetada que transpassou o coração de
Cristo, já morto, viu-nos nascer, como filhos de Deus, também do coração de
Maria, onde somente de fato foi sentida a dor que rasgara o coração do crucificado.
Se a Igreja nasceu do
coração transpassado de Cristo, donde jorrou sangue e água, símbolos do batismo
e da eucaristia, todos nascemos também do coração de Maria que, ali estava de
pé, em atitude de total entrega com Jesus à vontade do Pai.
A Igreja Católica,
firmada, nas Escrituras, representa Maria Santíssima, com muitas imagens, ora
apresentando suas virtudes e sua participação singular na obra de nossa
redenção, ora representando suas manifestações extraordinárias na vida do povo
cristão. O primeiro fruto da redenção de Cristo, operada na Cruz, foi
a redenção de Maria, por preservação do pecado original, e o fruto final, sua
glorificação pela assunção, em corpo e alma, aos céus.
O caminho e o destino
final da humanidade de Jesus são também o caminho e o destino final dos que o
seguem. Em Maria tudo acontece com total perfeição, e por primeiro. A
ressurreição de Jesus foi vivida por ela com a mesma intensidade com que viveu
seu sacrifício redentor ao pé da cruz. Não houve aparições de Jesus
ressuscitado a Maria.
Ela viveu em sua alma
a ressurreição de Jesus no mesmo instante em que Ele ressuscitava. Sua alegria
foi intensa, mais plena ainda do que aquela vivida quando do mistério da
encarnação do Verbo pela atuação do Espírito Santo. Sustentou os apóstolos na
expectativa da vinda do Espírito Santo (At 1,14) e, com certeza, esteve com
eles, animando-os, nos inícios da missão.
Unida ao Cristo no
caminho de sua existência terrena como mãe e como singular cooperadora, a Ele
está unida, plenamente remida, na glória do céu, onde nos precedeu e de onde
nos acompanha com sua intercessão permanente.
Se Cristo intercede
permanentemente por nós, com certeza ela o acompanha também nessa intercessão,
como o acompanhou até o ato extremo de amor com que Cristo se ofereceu por nós
na Cruz.
No próximo dia 15
estaremos celebrando na Catedral a festa de Nossa Senhora da Ponte que esteve
visitando as paróquias de nossa Arquidiocese. Sua imagem lembra-nos sua
presença de mãe na vida de nossa Igreja e de nossa cidade.Que Ela, a Mãe,
abençoe seu Povo!
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