quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Madre Cabrini, os Andes e a Argentina.


O Papa Francisco é uma pessoa cativante. Em pouco tempo de papado tornou-se celebridade a ponto de tudo o que lhe diga respeito seja considerado notícia. Em meio a tantos detalhes de sua vida, um sobressai, como a notícia  publicada pela revista “Veja" sobre o bairro  de Flores, em em Buenos Aires  onde  Jorge Mário Bergoglio passou  sua infância e juventude: ”A poucas quadras da casa onde cresceu Bergoglio, estão pelo menos outros três pontos importantes em sua vida. Um deles é o colégio que frequentava quando criança, Nossa Senhora da Misericórdia. Outro é a Paróquia Santa Francisca Javier Cabrini, onde celebrou missas quando era vigário regional do bairro.”


Mário Escobar diz a mesma coisa em seu livro: "Francisco, o papa da simplicidade” ( 2013, Agir, Editora Nova Fronteira): “Perto do colégio público Antonio Cerviño, onde Jorge  Mário Bergoglio estudou e foi um aluno exemplar, fica a paróquia Santa Francisca Xavier Cabrini, onde o futuro papa celebrou a primeira missa como vigário regional em seu bairro de Flores.”

Em comum nas duas citações temos a “Paróquia Santa Francisca Xavier Cabrini”, a santa alvo de nossa pesquisa e reflexões.

Santa Francisca Xavier Cabrini é importante para o catolicismo na Argentina, a terra do Papa. Sua presença naquele país aconteceu partir da metade do ano de 1895, segundo o livro compilado por Angela Martignoni: "Santa Francisca Xavier Cabrini, a Mãe dos Imigrantes” (A Casa Editora), para comemorar os 150 anos de nascimento da 'Santa Madre Cabrini’ como é conhecida, especialmente no Brasil. 

Quem estudou em algum dos muitos colégios cabrinianos ouviu mais de uma vez a história da Madre forte e decidida que se aventurou a cruzar a Cordilheira dos Andes, com o intuito de chegar a Buenos Aires. Mesmo sabendo que o Arcebispo que a havia chamado para ali estender seu  apostolado havia falecido, e ela ali chegaria sem ter a quem se apresentar. Considerava o convite como uma ordem de Deus, em quem confiava plenamente.

 A narração da viagem mereceria ser considerado um roteiro para um filme de aventura, de época. Eis alguns trechos dela: 

“ E a viagem apostólica continuou. O navio cristófaro seguia sua rota no Pacífico. Na manhã de de 22 de junho (1895) chegaram  a Gallao, onde Madre Cabrini desembarcou com sua única companheira, a irmã Clara. O navio deveria fazer uma parada, para se abastecer de mercadorias. E a Madre teve tempo de pegar o trem direto para Lima, no Peru, pátria de Santa Rosa de Lima, à qual havia prometido um “visita” e uma comunhão. A “visita"à santa Rosa e a comunhão recebida na igreja dos Dominicanos a compensaram de todos os sacrifícios  da viagem.

Retomaram novamente ao navio, onde foram festivamente recebidas como pessoas da família.

Era o momento de decidir o itinerário da viagem: descer até o extremo sul da América e através do estreito de Magalhães continuar a viagem pelo Atlântico até Buenos Aires, ou atravessar os Andes, no dorso das mulas.

Foi decidida a travessia pelo Andes.”

"Passando por Valparaíso, seguiram de trem até Santiago. A  passagem dos Andes estava impedida por causa da neve  que naqueles montes atingia um metro de altura. 

Tiveram portanto, alguns dias de descanso forçado . Mas aconteceu naqueles dias, um pequeno fato, sinal evidente da proteção da Divina Providencia  sobre ela, e que muito a confortou, estimulando-a a nada temer.

É a própria Madre quem narra: “Enquanto estava rezando fervorosamente , no Santuário de Santa Filomena, muito venerada no Chile, uma voz humilde e suave me sussurra sobre a cabeça: esta é uma pequena esmolinha de Santa Filomena. Acreditando ser uma ilusão, nem sequer me movo; mas a voz repete as mesmas palavras. Então levanto os olhos e vejo uma mão que se avizinha das minhas e aí coloca algumas moedinhas de ouro dentro de uma bolsinha. Era a Santa que oferecia sua ajuda por intermédio do Sacerdote Capelão do Santuário. Emocionado, a vista daquelas duas pobres Missionárias,  que vagavam por aquelas paragens, ele oferece a sua ajuda, como também uma pequena imagem da Santa, recomendando-nos conservá-la sempre conosco, e afirmando que a Providência jamais nos faltaria.”

Em 23 de novembro a Madre partia de trem para os Andes, com a Caravana da Companhia Transalpina de Santiago”. 

Daí para a frente, em outro veículo o grupo se embrenhou no vale onde se avistavam montes altíssimos.

Espetáculo incomparável! Muitas vezes a Madre agradece a Deus pela maravilha de suas obras, com um comovido hino de ação de graças.

"Por sorte – conta a Madre, nos foi recomendado um guia, uma espécie de Anjo da Guarda, com aparência de São José. Ele foi para nós um valioso auxílio. As conversas dos companheiros de viagem não eram, na verdade, nada tranquilizadoras. Vi que havia em todas as pessoas uma mal disfarçada preocupação, por causa dos iminentes perigos: a montanha podia se abrir em grandes fendas, o ar tornava-se rarefeito e alguns pontos era dificilmente respirável.”

Prossegue Angela Martignoni: Mas  a Madre, que não era nem fraca nem arrojada, incutia nos outros a força de sua vontade, infundindo-lhes coragem. Fazia-os contemplar a intensa luz da lua, que admiravelmente resplendia. E parecia que as montanhas tocavam o céu, como que coberto de um manto azul. Quem quer que contemplasse  aquele espetáculo, era levado a experimentar quase um êxtase sublime.

A Madre fazia notar aos viajantes que a terra tinha amor do céu; o conjunto da montanhas lembravam listras de um azul mais escuro ou mais claro, e as nuvens estupendas pareciam saudar a Rainha do Céu, a Mãe de Deus, e a seus mensageiros celestes, que são os Anjos. E ao falar de Nossa Senhora, a Madre afirmava que a Santíssima  Virgem protege, de maneira especial, os peregrinos.

E assim a Madre conseguia transmitir aos outros, a tranquilidade e a calma.

“Chegando a um certo ponto, faltou-nos o ar, mas não entendíamos o porquê. E eis que o nosso condutor, aquele ao qual chamávamos São Jose, vem ao nosso encontro para dizer-nos que deveríamos acelerar o passo, porque naquele ponto está a “puna”. A ‘“puna” é uma palavra  espanhola que significa “falta de ar causada pelo desequilíbrio da temperatura”. Apressamos o passo. Um minuto depois o ar estava puro como antes.

Caminhávamos em fila indiana, conduzidos pelos passos seguros e firmes das mulas que, indiferentes aos perigos dos abismos e das fendas pastavam tranquilamente às bordas dos precipícios.

Continua Angela Martignoni: Enquanto isso via-se, por aqueles caminhos nevados, logo após o guia, uma Religiosa, a primeira da fila, abrindo pista para afrontar aquelas brancas altitudes da neve imaculada. Realidade e símbolo ao mesmo tempo: aquela frágil mulher com sua força moral arrasta com seu exemplo de coragem e tranquilidade, uma fila de quarenta peregrinos. É que ela possuía a energia superior de conduzir com seu testemunho de graça a milhares de pessoas.

Depois de uma breve parada a caravana retomou o caminho. Chegou-se ao "Monte Cambie”, o ponto mais alto, nas proximidades do vulcão Aconcágua. 

Com puríssima alegria a Madre abraçou emocionada a imensidão do espaço, com o olhar estático e o coração transbordante de reconhecimento, ao Criador. São imensos os horizontes do céu!

Aquele ponto marca a fronteira entre o Chile e a Argentina.

A Madre elevou de seu coração um hino de ação de graças a Deus que lhe permitia desfrutar de tantas maravilhas e expressou este seu pensamento por escrito, nos registros da “Casa do Pouso”onde os viajantes  costumam deixar suas impressões.

Às  14 horas, tomaram novamente as condução para se dirigirem a “Punta de Vargas”. 

No dias seguinte, um trenzinho, deslizando pelo escarpado caminho em declive, deixou a Madre e a sua companheira  sãs e salvas, na cidade de Mendonza.

Sejam dadas graças a Deus!

Usufruindo da cordial hospitalidade das Irmãs do Bom Pastor, puderam descansar seus doloridos corpos, depois de tanta agitação e fadiga.

No dia seguinte tomam de novo o trem para uma volta de dois dias através do verde dos Pampas. 

Em 1° de dezembro de 1895,  chegaram finalmente à meta: Buenos Aires.

Uma vez em Buenos Aires a Madre, por intermédio de um padre seu conhecido encontrou-se com o novo Arcebispo, que lhe deu autorização para ali instalar um colégio. Depois de conseguir uma boa  casa onde o instituto pudesse funcionar, onde seria instalado o colégio,  mandou telegramas a Nova York e Codonho pedindo que mais irmãs para ali fossem para o início das atividades.

Conta-se que a Madre e sua irmã de congregação passaram o Natal ali sozinhas  executando todos os trabalhos físicos que podiam para o funcionamento do colégio. Sua grande devoção ao Menino Jesus, iluminava seus trabalhos e planos. 

Certa vez, o Arcebispo chegou para ver as obras do novo educandário católico e a Madre se encontrava à frente da casa, de avental e roupas de serviço,  às voltas com vassouras e outros materiais de limpeza. O Sr. Arcebispo lhe disse que queria falar com a Madre Cabrini. Ela então, fê-lo entrar, assentar-se e aguardar um pouquinho que a Madre viria atendê-lo.  Minutos depois, voltava vestida com o hábito, e se reverenciava diante do sucessor dos apóstolos, com toda a sua dignidade de fundadora junto com sua Irmã. Dizem que os três riram muito da situação.

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